Grupo flagra vocalização de ave 'fantasma' da floresta amazônica; veja vídeo
27/06/2025
(Foto: Reprodução) Registro feito na capital do Acre mostra a sanã-de-cabeça-castanha, espécie discreta e pouco conhecida, cantando na natureza Grupo flagra vocalização de ave 'fantasma' da floresta amazônica; veja vídeo
Um momento emocionante e raríssimo foi registrado no último sábado, 21, na floresta amazônica de Rio Branco, no Acre. Logo pela manhã, o guia e biólogo Kenny Uéslei conseguiu filmar a vocalização de uma das aves mais discretas e difíceis de observar na natureza brasileira: a sanã-de-cabeça-castanha (Anurolimnas viridis).
Com pouco mais de 20 centímetros e hábitos secretos no interior da mata densa, registros em vídeo são praticamente inexistentes da espécie.
"Quando percebi que ela começou a vocalizar bem na minha frente, minhas mãos tremiam. Era uma adrenalina absurda", conta Kenny, que trabalha há anos guiando clientes atrás da avifauna amazônica.
Sanã-de-cabeça-castanha?
De plumagem discreta e comportamento furtivo, a sanã-de-cabeça-castanha mede entre 19 e 21 centímetros. Como o nome sugere, tem a cabeça e o peito em tons castanho-ruivos, enquanto o restante do corpo mistura oliva e tons acastanhados.
Sanã-de-Cabeça-Castanha também observada no Acre, mas em 2016
Tomaz Nascimento de Melo/iNaturalist
A ave vive escondida no sub-bosque das florestas amazônicas e em áreas de vegetação densa, como capoeiras e tabocais, ambientes onde a visibilidade já é naturalmente limitada. É encontrada em regiões do Brasil, Peru, Bolívia, Equador e Colômbia, mas sempre em baixíssima densidade e dificilmente vista a céu aberto.
Espécie rara
Mesmo entre os observadores de aves mais experientes, poucos já viram a sanã-de-cabeça-castanha. "É o tipo de ave que muitos passarinheiros nem sequer conhecem. Normalmente a gente detecta só pela voz, e mesmo assim, é difícil, pois a ave nunca aparece", explica Kenny.
A vocalização da espécie é uma série de assobios melódicos e suaves, descritos como um “wee-hoohoo...”, e ouvir esse som em campo já é um privilégio. Registrar em vídeo, então, torna-se um feito ainda mais especial.
O flagrante foi feito durante uma expedição no Acre, dentro de um tabocal — vegetação densa formada por bambus nativos, habitat preferido da ave. Kenny conta que estava acompanhado de dois clientes, os engenheiros Públio Rodrigues e Silvia Maria Botacini.
A sanã-de-cabeça-castanha foi flagrada pelos três observadores de aves
Públio Rodrigues
"Estar em uma trilha e ouvir o canto de uma sanã já é bastante emocionante. Conseguir observar com o binóculo ela chegando, vendo a carinha, vendo os pezinhos, tudo atrás das folhas, dos galhos, também já vai ficando mais emocionante ainda. A hora que ela aparece no meio da trilha e dá o show cantando, se mostrando para gente por um bom tempo, aí então é até difícil segurar o binóculo de tanta emoção", descreve Silvia.
Mesmo acostumado a estar na floresta toda semana e presenciar diversos encontros especiais com a fauna, ao perceber a aproximação do animal, o guia Kenny precisou controlar a emoção para conseguir registrar a cena.
Foi por cerca de 40 a 50 segundos que ela ficou ali, e por alguns segundos começou a vocalizar. Acho que demorei a pegar a câmera de tão emocionado que estava. É um daqueles momentos que a gente nunca esquece
Embora não se saiba se esse é o primeiro vídeo de vocalização da espécie, trata-se, com certeza, de um dos pouquíssimos existentes. Além da sanã que aparece nas imagens, o grupo ainda conseguiu observar outra sanã que estava próxima e ouvir o canto de outras duas do outro lado da estrada.
Um alerta sobre a conservação
Apesar de classificada atualmente como “Pouco Preocupante” pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), a real situação da sanã-de-cabeça-castanha é incerta. A espécie depende de ambientes preservados e fragmentos de floresta pouco perturbados — áreas cada vez mais ameaçadas pelo desmatamento e pela expansão agrícola.
A falta de dados sobre sua distribuição, hábitos alimentares e reprodução acende um sinal de alerta. “Cada registro, como esse, é fundamental para preencher as lacunas de conhecimento sobre a espécie e reforçar a importância de conservar essas áreas”, afirma Kenny.
A sanã-de-cabeça-castanha é raramente vista
Kenny Uéslei
O biólogo faz questão de agradecer ao Ricardo Plácido, monitor ambiental e guardião das matas acreanas, que acompanha de perto as espécies da região e foi responsável por indicar os locais onde a ave poderia ser encontrada.
“Sem o apoio dele, esse registro não teria sido possível. O trabalho desses profissionais que conhecem cada canto da floresta é essencial para a conservação da biodiversidade amazônica”, conclui Kenny.
VÍDEOS: Destaques Terra da Gente
Veja mais conteúdos sobre a natureza no Terra da Gente